sábado, 3 de novembro de 2012

Prefeitos preparam 'herança maldita' para inviabilizar início da gestão de adversários eleitos

Após derrota nas urnas, gestores atrasam salários, abandonam obras, exoneram comissionados e prometem anúncio concurso a dois meses do fim do mandato


O que acontece na Paraíba se repete em São Francisco do Brejão - Ma


Exonerações, transferência de cargos, pagamento de salários dos servidores atrasado, retirada de gratificações, anúncio de concursos públicos, ameaças contra servidores e abandono de obras. Estas são algumas denúncias que o Ministério Público da Paraíba (MPPB) recebeu nestes últimos dias. Os acusados são os atuais prefeitos de diversos municípios paraibanos, em diferentes regiões do Estado. Em todos os casos, uma coincidência: são prefeitos que perderam as eleições no último dia 7 de outubro.

Em Solânea (distante 138 quilômetros de João Pessoa), no Agreste paraibano o clima é de insegurança entre os moradores. O atual gestor municipal Francisco de Assis Melo (PMDB), conhecido como Dr. Chiquinho, apoiou Edvanildo Júnior (PMDB), que obteve 6.112 votos (41,76% do total) e foi derrotado nas urnas pelo ex-prefeito Beto do Brasil (PPS), que teve 8.523 votos (58,24% do total). No município há denúncia de abandono de obras, como é o caso da escola José Menino de Oliveira e do ginásio poliesportivo Adauto Silva, que estão paralisadas há mais de um ano. Segundo um morador, que não quis ser identificado "com medo de perseguição", cerca de sete servidores municipais foram exonerados dos cargos. No mês de setembro, o pagamento do magistério, que geralmente ocorre no dia 30, foi realizado apenas no dia 11 de outubro. Também há denúncia de que o lixo não é mais recolhido e as árvores não estão sendo podadas.

Esta situação ocorre também no município de Alhandra (distante 42 quilômetros da Capital), na região do Litoral Sul da Paraíba. O atual prefeito, Renato Mendes (DEM), tinha Gorete Mendes (PSDB) como candidata nas eleições 2012. A tucana recebeu 6.129 votos (45,79% dos votos válidos), perdendo para o peemedebista Marcelo Rodrigues, que obteve 7.256 votos (o equivalente a 54,21% do total dos votos válidos).

Em Sapé (distante 55 quilômetros de João Pessoa), também na região da Mata paraibana, uma situação peculiar. O atual prefeito, João da Utilar (DEM), desistiu da reeleição e viu seu opositor, Roberto Feliciano (PSB), ganhar a eleição com 12.010 votos (47,11% do total). Nos dois municípios da região da Mata, também há denúncias de 'abandono' de obras e transferência de servidores para exercer funções abaixo de suas qualificações.

Esses três prefeitos também respondem a acusações de envolvimento em esquema fraudulento de desvios de recursos públicos destinados a eventos na Paraíba. Os gestores chegaram a ser presos em operação denominada ‘Pão e Circo' deflagrada no dia 28 de junho de 2012 pela Polícia Federal, Controladoria Geral da União (CGU) e Ministério Público. Além deles, outras 25 pessoas foram presas em 18 prefeituras paraibanas.

'Perseguições Políticas'

O promotor de Justiça Marinho Mendes revelou que quatro prefeitos do Litoral Norte paraibano foram denunciados por perseguição política e que o Ministério Público da Paraíba pode penalizar os prefeitos pelos ilicitos. "Após as eleições, começaram a chegar à Promotoria reclamações de perseguição política. A recomendação específica é que os gestores devem evitar exonerações e cortes de gratificações sob pena de serem responsabilizados", afirmou.

Os prefeitos citados pelo promotor são de Jacaraú (distante 84 km de João Pessoa), Maria Cristina da Silva; de Pedro Regis (distante 91 km da Capital), Severino Batista de Carvalho; Curral de Cima (distante 76 km de João Pessoa), Nadir Fernandes de Farias; e de Lagoa de Dentro (distante 97km da Capital), Sueli Madruga Freire.

No Litoral Sul, a situação tornou-se tão caótica que os servidores, com salários atrasados há três meses, fecharam na manhã desta quinta-feira (25) a PB 044 que dá acesso a cidade de Pitimbu, distante 68 km de João Pessoa, para chamar a atenção da autoridade política. Os funcionários municipais denunciam que as escolas estão praticamente paradas, ônibus escolares sem funcionar por falta de combustível e falta d'água e  sistema de água e esgoto sem funcionamento. 

De acordo com a estudante Joana Darc da Silva, as escolas estão paradas porque os professores não estão recebendo salários. Ela disse, ainda, que não há merenda em algumas unidades. "A revolta tem sido geral. O funcionalismo está numa situação difícil e o que o prefeito diz é que não vai pagar a ninguém até o fim do seu mandato", contou. O prefeito citado pela estudante é Rômulo Carneiro (PP), que não atendeu as ligações. 

No Sertão da Paraíba, a situação não é diferente. O prefeito do município de Cachoeira dos Índios (distante 481 km da Capital), Têta Francisco (PR), demitiu cerca de 125 servidores públicos comissionados, inclusive secretários. Apenas dois auxiliares diretos do gestor público, os secretários de Finanças e o de Administração, ficaram de fora do corte. De acordo com o prefeito, a medida foi necessária para conter despesas a convocar novos concursados. "Tive que demitir alguns funcionários para contenção de despesas necessária em qualquer prefeitura. A Justiça também exigiu que os concursados sejam convocados e isso está acontecendo aos poucos", disse.

O presidente do Sindicato dos Funcionários Públicos de Patos, José Gonçalves, denunciou nesta quinta-feira (25) que sete prefeituras da região sertaneja estão atrasando salários dos funcionários. Segundo ele, as cidades de Malta, Condado, São José dos Espinharas, Catingueira, Olho D´água, Emas, São José do Sabugi não pagam os servidores efetivos desde setembro. Já os contratados, desde agosto. 

Segundo José Gonçalves, caso a situação não seja resolvida, eles entrarão na Justiça pedindo o bloqueio dos recursos federais dos municípios que estão nesta situação. Ele disse ainda que, após as eleições, os prefeitos que não se reelegeram ou não conseguiram eleger os aliados, desapareceram das prefeituras. "Nós estamos vivendo num sistema de parlamentarismo, onde os prefeitos desapareceram, deixaram um ministro que é um secretário, que sabe da real situação, mas não fazem nada", frisou.

Concursos ao apagar das luzes


Faltando pouco mais de dois meses para o fim dos seus mandatos, prefeitos do interior da Paraíba anunciaram a realização de concursos públicos para contratação de servidores públicos. Por quase quatro anos, esses mesmos prefeitos sustentaram estruturas de servidores contratados com vínculos precários, mesmo com a recomendação expressa do Ministério Público Estadual para a obrigatoriedade desses concursos.
  
Pelo menos cinco atuais gestores que deixam as prefeituras no próximo de dia 31 de dezembro já confirmaram o anúncio das provas: Djaci Brasileiro (PSDB), Itaporanga; Flávia Galdino (PSB), Piancó; Carlos Rafel (PTB), Cajazeiras;  Fábio Tayrone (PTB), Sousa; e Lavoisier Dantas (PP), São João do Rio do Peixe. Todos tem como justificativa justamente as recomendações do MPE e leis que foram aprovadas no início do ano e que, só após o resultado desfavorável nas urnas, resolveram cumprir.

Em Cajazeiras, o atual prefeito exonerou todos os cargos comissionados e resolveu anunciar a realização de concurso público. A prefeita eleita Denise Oliveira (PSB) anunciou que vai à Justiça para impedir a realização dessas provas a pouco mais de 60 dias. 

Mesmo alegando que a economia do município comporta o concurso, o prefeito não consegue atualizar os salários dos servidores. Nesta quinta, a Promotoria de Justiça de Cajazeiras anunciou uma ação civil pública contra Carlos Rafael Medeiros de Souza, em virtude do atraso no pagamento dos salários dos servidores públicos municipais. 

De acordo com o promotor de Justiça Túlio Cezar Fernandes Neves, titular da Promotoria de Direitos Difusos de Cajazeiras, após ser derrotado no último dia 7, quando buscava a reeleição, o atual prefeito passou a não honrar com a sua obrigação de pagar ao funcionalismo municipal.

“Com uma máquina administrativa extremamente assoberbada de gastos, dos mais variados tipos, avizinha-se o desfecho da administração municipal que, amargando o gosto da despedida e da derrota no pleito eleitoral, brinda sua população com 'arrochos', minimização de serviços públicos essenciais, adiamento do pagamento de alguns fornecedores e, o que é pior, atraso no pagamento dos vencimentos dos servidores municipais”, pontuou o promotor.

Na ação movida pelo Ministério Público, a Promotoria requer o bloqueio de 60% do valor de todas as receitas do município, creditados na conta da Prefeitura Municipal, necessários à cobertura dos salários e proventos do funcionalismo, até o mês de dezembro de 2012, inclusive o 13º salário.

Em seu artigo 21, a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) determina que o ato que resultar em aumento da despesa com pessoal será nulo se expedido nos 180 dias anteriores ao final do mandato do titular do respectivo Poder ou órgão.

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