quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

Andar em lugares onde ninguém nunca andou



Os três irmãos Villas-Boas reescreveram a história do povo nativo do Brasil. Mas é a história desses três irmãos, que o cinema vem recontar e resgatar no filme Xingu, que estreou na última sexta-feira (06/04) e que tive o privilégio de assistir no domingo de Páscoa de aniversário de Cuiabá, terra indígena que teimamos em civilizar.

O filme, muito melhor do que Avatar, naquilo em que os dois se propõem, narra a trajetória da família Villas-Boas, especialmente dos irmãos Orlando, Cláudio e Leonardo, e sua entrega à causa indígena, passando pela criação do Parque Indígena do Xingu, não sem antes travar lutas verdadeiras com o “homem branco”, em todos os terrenos possíveis. 

Muito dificilmente o filme terá grande aceitação entre o público comum, mas isso não importa, marcará sem dúvida a vida dos que o verem, com o olhar humano que ele trás. É belo, pela história que conta, sem imparcialidade. Afinal nunca houve imparcialidade nessa história de 500 anos, sempre houve dois lados.

A história pode ser entendida antes mesmo de o filme começar, nos créditos, nos quais aparecem apoios e patrocínios de São Paulo e Rio de Janeiro, e nenhuma menção ao estado de Mato Grosso, que parece carregar o fardo e o esquecimento eterno daquela região, como quiser considerar, e a discriminação nua e crua do nativo indígena, pela sua preguiça “macunaíma”, ou seus hábitos já não-indígenas que ajudamos a criar.

Mas o filme é melhor e muito maior que isso, e ajudará a inserir o nome de Orlando e Cláudio Villas-Boas, como verdadeiros heróis nacionais, afinal entende-se por patriotismo a defesa da nação, e não há nação mais brasileira do que a dos naturais dessa terra.

É esplêndido sair do cinema, após a imagem do “Índio Solitário” que encerra o filme, pintado de luto, com o olhar triste e derrotado, deixando em nossos corações uma profunda angústia, sem explicação. Questionadora.

A mim lembrou Renato Russo, e beu sentimento oscilou entre a letra visceral de Que País é Este? “Mas o Brasil vai ficar rico, vamos faturar um milhão, quando vendermos todas as almas dos nossos índios num leilão” e a pensativa Índios que talvez reflita melhor a verdadeira sabedoria indígena em seus questionamentos: 

"Quem me dera ao menos uma vez.
Entender como um só Deus ao mesmo tempo é três.
E esse mesmo Deus foi morto por vocês
É só maldade, então, deixar um Deus tão triste."

Talvez seja por isso, que Xingu tenha estreado na sexta-feira santa. Quando lembramos o dia que matamos o nosso Deus.




“A algo neles que morre quando a gente toca”
(Cláudio Villas-Bôas)

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